Vou confessar um segredo. Aos 17 anos tirei meu título de eleitora porque não poderia prestar vestibular sem ele. Desde então, morei em outras quatro cidades e o título continua lá naquela primeira cidade do cursinho do vestibular.
Voltei ali para votar apenas duas vezes, ambas no segundo turno presidencial. A matriarca alugou o meu ouvido por cerca de 20 minutos quando lhe disse que havia votado no Lula pela segunda vez. Até os cinco primeiros minutos, eu tentei explicar que assim como ela entendia que o governo do PT estava destruindo os pequenos e médios empreendedores rurais, eu entendia que estava construindo pequenos e médios empreendedores culturais. Pretérito imperfeito, sejamos francos.
Na casa dos meus pais, o som quebrou há seis ou sete anos e ninguém consertou. Eu sempre achei isso uma coisa inacreditável. Um símbolo da diferença entre a matéria da qual meus progenitores são feitos e a matéria da qual sou feita. Só que não.
Os quatro anos que trabalhei exclusivamente para a cultura foram a época em que menos consumi arte. Conheci alguns festivais no Brasil e consegui assistir os filmes selecionados em apenas um desses eventos. E ainda que tenha chegado a Cuba, não pude estender a viagem e conhecer o Festival de Havana.
Durante esse tempo, nunca soube o que era sentar em um bar e falar de amenidades, a chamada filosofia de botequim. Foram muitos os bares, mas a conversa era a mesma, sempre começava pragmática e terminava política. A relação mais duradoura que tive foi com o financiamento de um carro que salvou a produção ilimitada. Mas não, tinha um plano, esse limite, antes que virasse 2014. Respiraria fundo todos os dias, assumiria todas as funções apresentadas e, ufa, cair no mundo.
Antes, havia esse trailer rodando. Pouco eu sabia além da intuição de que melhor seria desocupar um cargo público em comissão antes das campanhas de governador e presidente. Mas, antes, houve as campanhas de prefeitos.
E Palmas não é uma capital qualquer. É a mais nova do país e abriga gente vinda de norte a sul. Gente que teve a coragem de mudar para chegar ali. Ou de fugir, tudo bem. O mal é contentar-se com as mudanças, quando são viáveis as pequenas revoluções. Quando sentado à mesa das autoridades, falar de boca cheia pode até ser falta de educação, mas é sinal de coerência. O que diferencia aquele que assina a ordem de despesa e aquele que assina o parecer é que o segundo pode falar pelos cotovelos. No entanto, um conjunto de ideias só pode virar alguma ação depois da assinatura do primeiro.
A problemática não se resume, porém, à burocracia e aos conflitos de interesse. Eu acho que existe uma confusão generalizada quanto à independência dos poderes. Deveríamos entender melhor a ligação estabelecida entre os três e tirar bom proveito dela. O povo fica jogando na megasena da virada sem fazer a conta dos 8 milhões que migraram da cultura do estado em 2012, por exemplo. Quando é um caso mais nebuloso, uma assinatura só não faz verão. Tem que alterar o texto legal. É na assembleia legislativa onde, votando, tudo se obriga. Em 0,5% ninguém mexe, isso aí é o fundo da cultura!
Se a teoria e a prática são desconexas, não é de se estranhar que a participação social seja inversamente proporcional ao benefício excepcional. O controle social tem como predicado a cooperação. O benefício tem começo, meio e fim na exceção.
São mínimas as recompensas do trabalho cooperativo, isso é uma verdade. O mais perto que se chega de um pouco de glória é quando aquela ideia vira pelo menos o artigo de uma lei. Ou de uma resolução, vá lá. E se dê por satisfeito que outro tipo de artigo só com mestrado. E no Brasil, afinal, esse negócio de concurso, ou lei ou empresa é igual: se você acha difícil abrir é porque nunca precisou fechar.
Vale também para os ciclos da vida. Se doce é morrer no mar, a distância pode ser muito amarga para um paladar sensível. Vou ali na esquina comprar balas de framboesa e volto já.